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Como superar o luto?

Colaboração
Não há uma fórmula matemática, mas, quando se está a passar por um processo de luto, há uma série de etapas por que se deve passar.

Quando morre alguém querido ou quando se termina um relacionamento, é normal sentirmo-nos tristes ou perdidos. Começa, assim, um processo de luto, que resulta de uma perda “significativa e importante para alguém”, afirma Diogo Capela, especialista em Psicologia na Clínica Lusíadas Almada

Por norma, está associado à morte de alguém, mas também pode estar ligado a determinadas circunstâncias ou eventos da vida: o fim de uma relação, a perda de um membro após uma cirurgia ou a morte de um animal doméstico.

Apesar de se tratar de um processo natural, é também “doloroso”, por fazer parte de um processo de recuperação desta perda que ocorreu. “É quase como se fosse uma fase de restabelecimento do equilíbrio”, diz.

Os tipos de luto

Na realidade, existem vários tipos de luto.

  • O luto normal é aquele que é vivenciado pela maior parte da população, aceitando-se a perda e incorporando-a na experiência da pessoa. Pode durar cerca de um ano.
  • O luto antecipatório ocorre quando, antes da morte de um ente querido, a pessoa inicia a elaboração do processo de luto. Acontece, por exemplo, em caso de doença oncológica de alguém em cuidados paliativos.
  • O luto preparatório consiste no ajustamento de doentes e familiares à doença, por exemplo, no processo de vivência do doente do próprio luto perante a hipótese da própria morte. 
  • O luto prolongado/complicado é reconhecido como uma perturbação psicológica, em que é manifestada uma dificuldade e incapacidade na adaptação e reestruturação da vida perante a perda. Envolve um quadro clínico significativo de sintomatologia intensa que compromete o seu funcionamento mental.

O que se sente

Cada pessoa terá a sua experiência e o luto “é vivenciado de maneira diferente”, dependendo da perda em causa ou da própria pessoa. “Por exemplo, perante a morte de um avô, cada membro da família poderá sentir esta perda de maneira distinta”, explica. 

Mas há algumas emoções comuns neste processo. “Por norma, uma pessoa poderá sentir uma profunda dor, angústia, tristeza ou vazio, mas também há pessoas que poderão manifestar o luto através da raiva, culpa, desespero, desorganização completa ou até mesmo entorpecimento, a chamada anestesia, em que as pessoas não expressam qualquer dor ou emoção”, diz o especialista.

E, no que toca aos sentimentos, “não há uma fórmula mais correta” para ultrapassar o processo. “O sentir depende de vários fatores inerentes à relação que se perdeu”, esclarece Diogo Capela.

As fases no processo de luto

O luto deverá ser um processo com um fim ou então é apenas um sofrimento que se prolonga. Por isso, a investigação costuma apontar para três fases necessárias na superação do luto. 

  • A primeira fase é o choque ou a negação, em que existe uma necessidade de evitar a realidade. “Não queremos aceitar que a morte do ente querido aconteceu mesmo.” 
  • Temos depois a fase da desorganização ou do desespero. É neste estádio que se toma consciência do que sucedeu, manifestando-se, através da dor emocional, preocupações, recordações, e até mesmo, observa-se um défice da memória a curto prazo ou o desenvolvimento de sintomatologia somática como, por exemplo, cefaleias e perturbações gastrointestinais.
  • Por fim, ainda há a fase da reorganização ou recuperação, em que ocorre um processo de reajustamento à nova realidade, e, até mesmo, a uma realidade identitária distinta. “É a identidade do próprio sem a pessoa que era próxima que é reorganizada.”

Ainda assim, estas fases não são estanques. “Pode haver avanços e recuos”, afirma o especialista. “O processo é complexo, ativo, multidimensional, envolve muitos fatores e pode, às vezes, ser uma autêntica montanha russa — num momento, as pessoas podem sentir-se estáveis, mas noutro estamos completamente em queda livre, como se a pessoa tivesse morrido no dia anterior.”

A duração

Em geral, o luto poderá durar de alguns meses a alguns anos, ainda que seja tudo variável. “É claro que a primeira fase — o choque ou a negação — tem lugar numa fase mais aguda. Contudo, sendo um processo muito único, não conseguimos dizer exatamente quando é que será expectável que uma pessoa já tenha concretizado o seu luto”, afirma. Mas quando é que o luto termina? “O luto termina quando se é capaz de pensar na pessoa que morreu sem dor, recordando memórias felizes, sendo de novo possível investir emocionalmente na vida”, afirma Diogo Capela.

Ainda assim, pode diferenciar-se um processo de luto normal de um processo mais patológico. “O luto patológico ocorre quando a disrupção da vida diária, da qualidade de vida e do bem-estar da pessoa estão de tal forma comprometidos, que o próprio funcionamento mental é impactado. Aqui, o apoio de um profissional é determinante para dar o devido suporte e fazer uma intervenção, no sentido de elaborar ou digerir melhor este processo.”

Estratégias para um luto mais fácil

Existem alguns caminhos a seguir que poderão contribuir para que o luto seja mais fácil de superar.

  • Há que reconhecer as emoções e permitir senti-las, já que elas fazem parte da elaboração do luto. 
  • É preciso falar abertamente sobre a morte com familiares, amigos e colegas. “Está comprovado que evitar falar sobre este tema poderá contribuir para um maior isolamento social que, por sua vez, poderá dificultar o processo de elaboração mental.”
  • É importante manter um estilo de vida saudável, que inclua uma alimentação equilibrada, exercício físico regular e uma rotina de sono saudável. “Poderá ser fundamental para conseguir gerir todas as emoções e ultrapassar estes obstáculos.” 
  • Também deve manter uma conexão próxima com familiares e amigos, recordando a pessoa que morreu. “É uma perspetiva um pouco mais coletiva, porque o luto não tem de ser necessariamente marcado pela solidão.” 
  • Há que compreender ainda que o processo de luto, por vezes, é imprevisível, e que pode haver avanços e recuos. “Pode ser necessário também procurar apoio psicológico para facilitar este processo.”

A importância do apoio dos amigos e familiares

Uma parte essencial do processo é a intervenção da rede de apoio. “Às vezes, as pessoas poderão não saber exatamente o que dizer, poderão pensar que vão incomodar ou que vão estar a potenciar o sofrimento, mas a investigação e a experiência dizem-nos precisamente o contrário”, afirma Diogo Capela. 

Há várias formas de prestar apoio a alguém. Por um lado, abordar as temáticas diretamente, “de forma validante e compreensiva”, permite que a outra pessoa tenha oportunidade para se expressar e ser ouvida. E, ainda que não se saiba o que dizer, o importante é demonstrar presença e disponibilidade para escutar. “Mesmo quando não sabemos o que dizer, podemos dizer isso mesmo: esta situação e sofrimento, fico sem palavras, mas estou aqui para o que precisares.” 

Numa fase mais inicial do processo, um apoio mais prático poderá ser importante, aliviando a sobrecarga do enlutado. “Pode ser uma ajuda na gestão da rotina diária: as compras no supermercado, as refeições ou questões mais burocráticas, como ajudar na preparação do funeral”, enumera.

Outro ponto importante neste apoio é “escutar, de forma empática, sem julgar, sem diagnosticar, sem dizer o que fazer ou como fazer”, evitando comparar com a nossa própria experiência. 

O papel da terapia neste processo

Um profissional especializado pode fazer toda a diferença num processo de luto. “Poderá ajudar neste processo de elaboração mental da perda, na gestão das emoções, na diversificação de padrões de pensamento, identificando padrões menos ajustados ou negativos que não contribuem ou que dificultam esta gestão, bem como ajudar na promoção de um estilo de vida equilibrado e de expressões emocionais mais ajustadas”, afirma. “No fundo, poderá contribuir para a promoção da resiliência do enlutado, para o seu bem-estar e qualidade de vida, prevenindo o agravamento da sintomatologia e o possível desenvolvimento de outras patologias mentais.”

Há pessoas que podem necessitar de um apoio especializado em fases muito agudas do processo, por sentirem que o sofrimento é de tal forma elevado que impossibilita superá-lo sozinho. “Nós somos os nossos melhores termómetros neste sentido, ao nível emocional. Se não nos sentimos bem, podemos procurar apoio.” 

Mas também há quem procure apoio numa fase mais tardia, em que o luto não foi ultrapassado. “Quando existe efetivamente uma disrupção do funcionamento mental — a pessoa desenvolveu sintomatologia mais incapacitante e isto traz riscos acrescidos para a saúde mental e física, podendo haver uma evolução para perturbações mentais mais graves”.

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Dr. Diogo Capela

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