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Infertilidade: inseminação artificial e outros tratamentos

Colaboração
Mais de 290 mil casais em Portugal têm problemas de fertilidade — e quando a idade se aproxima dos 40 anos, esperar os 12 meses que costumam ser aconselhados para um diagnóstico pode ser demasiado. O especialista Luís Vicente explica porquê e quais as soluções propostas pelo Centro de Procriação Medicamente Assistida do Hospital Lusíadas Lisboa.

Diagnóstico de infertilidade

Considera-se que existe infertilidade após um ano de relações sexuais regulares e não protegidas sem que a gravidez aconteça. É por regra esse o prazo de espera recomendado ao casal, antes de procurar ajuda médica. “Mas há exceções”, alerta Luís Ferreira Vicente, especialista em Ginecologia e Obstetrícia do Centro de Procriação Medicamente Assistida (PMA) do Hospital Lusíadas Lisboa.

“Quando a idade se aproxima dos 40 anos, ou quando há ciclos sem ovulação (ciclos com duração superior a 35 dias são um indício), ou ainda quando se suspeita da existência de algum fator de infertilidade (por exemplo, por haver antecedentes de múltiplas cirurgias na mulher ou antecedentes de quimioterapia no homem), a investigação deve ser iniciada mais cedo”, explica o clínico. Nessas situações, “três a seis meses” de tentativas justificam uma primeira consulta.

Um problema transversal

“Não existe um número exato para a infertilidade. Mas podemos extrapolar a partir de outros países, em que o problema afeta entre 10% e 15% dos casais”, diz Luís Vicente. Já em 2009, “um estudo importante chamado AFRODITE estimava uma prevalência de infertilidade de 10% em Portugal, o que corresponderia a cerca de 290 mil casais”, acrescenta o especialista.

Causas e opções de tratamento

Disfunções de ovulação, nomeadamente pela síndrome de ovário micropoliquístico, e casos de obstrução das trompas de Falópio, muitas vezes causadas por infeções por clamídia, são as causas mais comuns de infertilidade feminina. Nos homens, em causa estão anomalias na quantidade, motilidade e forma dos espermatozoides. E pode também dar-se o caso de a infertilidade resultar de uma combinação de fatores do casal. “Antes de qualquer tratamento, há que fazer uma investigação cuidada e completa”, sublinha Luís Vicente.

“O Hospital Lusíadas Lisboa permite uma avaliação total no mesmo local: espermograma, exames radiológicos para avaliação da permeabilidade tubária, ressonância magnética para avaliação de malformações uterinas e endometriose”, acrescenta. Os resultados desse estudo permitem aconselhar o melhor tratamento.

  • Indução da ovulação

É sobretudo recomendada para casais jovens, em que o homem apresenta um espermograma normal e a mulher tem as trompas de Falópio desobstruídas, mas ciclos menstruais irregulares.

É o tratamento mais simples e consiste na administração de indutores da ovulação, responsáveis pelo desenvolvimento dos folículos nos ovários, por via oral ou injetável. Depois, “realiza-se uma monitorização ecográfica para determinar a ocorrência próxima da ovulação, que é desencadeada com medicação”, explica Luís Vicente. O objetivo deste acompanhamento é informar o casal da melhor altura para ter relações sexuais, mas também visa prevenir gravidezes múltiplas.

  • Inseminação intrauterina (IUI)

Associa-se à monitorização anterior a colheita de espermatozoides, que são concentrados em laboratório e inseminados in utero, através de um cateter, na altura em que a ovulação está a ocorrer. A técnica está indicada para casais que estão a tentar engravidar sem alterações de relevo no espermograma masculino e com as trompas desobstruídas. Na ausência espermatozoides, ou no caso de casais homossexuais ou mulheres que pretendem engravidar sozinhas, a IUI pode ser realizada com recurso a esperma de um dador. A taxa de sucesso da IUI é de 15% a 20% por cada tentativa e, após três inseminações, a possibilidade de engravidar não aumenta, apresentando-se como alternativa a FIV.

  • Fertilização in vitro (FIV)

É o método indicado para quando as trompas da mulher não estão permeáveis, o que significa que existe uma obstrução. Esta pode ocorrer no contexto de uma infeção pélvica ou nalgumas formas de endometriose (doença crónica que leva ao crescimento de tecido semelhante ao que reveste o útero em regiões vizinhas), ou até quando a causa do problema é desconhecida.

De acordo com o especialista, nestes casos, “a estimulação é maior, de forma a permitir a colheita de ovócitos [por punção, num procedimento de 10 a 15 minutos feito sob sedação], para serem fertilizados em laboratório (in vitro), sendo os embriões mantidos em cultura e transferidos para o útero 2 a 6 dias depois, através de um cateter”. São escolhidos um ou dois embriões, podendo os restantes ser criopreservados para utilização posterior.

A técnica é frequentemente a opção recomendada para casais que tentam engravidar há mais de 5 anos, ou mulheres com mais de 40 anos — e permite a utilização de ovócitos ou espermatozoides de dadores. As taxas de sucesso da FIV são de cerca de 35% a 45% por tentativa, de acordo com a idade da mulher.

  • Microinjeção intracitoplasmática (ICSI)

Em quase tudo semelhante à FIV, e igualmente com taxas de sucesso de 35% a 45%, a ICSI é uma técnica de maior complexidade laboratorial. Distingue-se pelo recurso à introdução de um espermatozoide em cada ovócito maduro, através de uma microinjeção. É utilizada sobretudo em casos de infertilidade masculina por alterações na qualidade ou da quantidade de espermatozoides ou após falhas de fertilização FIV anteriores. Quando não se conseguem obter espermatozoides no ejaculado, podem ser recolhidos por punção testicular de forma a se conseguir fertilizar o ovócito.

O que mudou

O progresso da Medicina faz-se notar nas grandes inovações, mas também nas pequenas mudanças, que diminuem o incómodo de tratamentos que já por si implicam uma forte carga emocional. Na área da fertilidade, a estimulação da ovulação continua a exigir medicação injetável, mas é agora feita com canetas de administração, em casa, e por períodos de 12 a 15 dias, em vez dos anteriores 30.

Existe também já “um medicamento que permite uma administração única de medicação, que permite a estimulação por sete dias, sem injeções diárias”, como explica Luís Vicente. No laboratório de embriologia, os métodos utilizados permitem atualmente “preservar os embriões e ovócitos, com uma percentagem de sobrevivência muito maior” e há outra evolução também muito positiva: “reduzimos o risco de hiperestimulação para perto de zero”, diz o especialista em PMA. Essas situações, em que a estimulação fugia ao controle clínico, “implicava o internamento em 5% das mulheres”.

Tentativa e erro

A taxa de sucesso dos tratamentos depende de múltiplos fatores, desde logo a idade da mulher. “Antes dos 40 anos, a probabilidade de engravidar ronda os 40% e os 50%. Depois dos 43 anos, a taxa de gravidez é menor que 5%. Isto, em qualquer parte do mundo”, explica Luís Ferreira Vicente. No entanto, alerta o clínico, “o que conta é a idade dos ovócitos. Em ciclos de doação de ovócitos, a taxa de gravidez é a da idade da dadora…Assim, depois dos 43 anos, a taxa de gravidez salta para os 40-50%”, afirma.

O Centro de Procriação Medicamente Assistida do Hospital Lusíadas Lisboa já ajudou a nascer muitos bebés. Contudo, Luís Vicente é cauteloso no balanço. “Não esquecemos os bons e os maus resultados. Temos de saber lidar com o sucesso e com o insucesso”, explica. Além dos casos reportados ao Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, Luís Vicente refere que o centro recebe muitos casais que vivem no estrangeiro, vieram a Portugal fazer o tratamento e depois tiveram os filhos lá fora.

Um dos casos que até hoje mais o impressionou, até pela persistência, foi o de um casal que veio da Alemanha, onde já tinha feito seis tratamentos sem sucesso, para tentar outra vez. “Infelizmente, uma vertente da Medicina da Reprodução considera que o resultado positivo é apenas uma questão de estatística. No Hospital Lusíadas Lisboa, investigámos se havia alguma razão para os insucessos, concluímos que havia e fizemos tudo para corrigir a situação.” Têm hoje dois filhos, gémeos.

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Revisão Científica

Dr. Luís Vicente

Dr. Luís Vicente

Coordenador da Unidade de Procriação Medicamente Assistida

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